Manual prático do golpe: da tropa na rua à decisão sobre o que fazer com o STF

Muito bem: e esse golpe de Estado “do Bolsonaro”? Sai ou não sai? Para quando é, afinal? Já agora, para o dia Sete de Setembro, junto com as manifestações pró-governo e anti-Supremo? Quando os caças Grippen da Força Aérea Brasileira chegarem enfim da Suécia e puderem quebrar os vidros do STF em Brasília, rompendo a barreira do som com voos rasantes sobre o seu edifício-sede? Quando os caminhoneiros fecharem a Transamazônica? Na próxima vez que os ministros derem “três dias de prazo” para o presidente da República fazer isso ou aquilo? A verdade é que todo mundo fala, fala e ninguém diz o mais importante: que dia e a que hora, afinal das contas, vai sair esse golpe de Estado. Isso a Globo não diz. Ninguém diz. 

Há algum tempo, não se sabe bem quanto, a mídia, a classe política, a nebulosa chamada “elite brasileira” e o universo intelectual-liberal-radical que toma vinho, lê jornal e se atormenta com a “variante delta” praticamente não falam de outra coisa: o golpe que será dado em algum momento por Bolsonaro ou, então, pelo seu primo-irmão, o conjunto de “atos antidemocráticos” que estão em tudo, em todas as pessoas e em todos os lugares ao mesmo tempo. Os editoriais vão assumindo um tom cada vez mais desesperado. Os jornalistas de televisão, entre um e outro momento de indignação com a ausência de máscaras nos estádios de futebol, veem um golpista atrás de cada poste de luz. Os políticos de “esquerda” vivem em histeria plena e permanente. E por aí vamos.

Quem estaria disposto a tirar do bolso uma nota de 2 reais para defender o STF?

Não é só conversa. O ministro Alexandre de Moraes, chefe de polícia do STF para a vigilância da boa ordem constitucional, despacha furiosamente num inquérito (100% ilegal) para descobrir atos “antidemocráticos”, reprimir a circulação de fake news e tornar as redes sociais seguras para a democracia. O corregedor de uma das dependências do supremo, o “TSE”, proibiu as plataformas digitais de pagarem as somas em dinheiro devidas para canais de comunicação de direita. O STF prende gente, como se fosse uma delegacia de polícia – pouco ligando para o que o Ministério Público, o único órgão oficial autorizado por lei a pedir

a prisão de alguém no Brasil, acha ou não acha disso. Um deputado federal em pleno exercício do seu mandato está preso – continua sendo deputado, mas tem de ficar em casa com tornozeleira eletrônica. O cantor caipira Sérgio Reis é chamado a depor na Polícia Federal. A CPI da Covid tem acessos repetidos de neurastenia.

Só mesmo uma ditadura de verdade, tipo essa com a qual nos ameaçam para qualquer momento, seria capaz de fazer tudo isso ao mesmo tempo – mas estamos no Brasil, e no Brasil de hoje é assim que funcionam as coisas; para manter intacto o Estado de direito, o STF tem o direito e o dever de mandar a Constituição Federal para o diabo que a carregue. Nada disso, é claro, está tirando o sono do brasileiro que chacoalha todo dia no trem da Central, acorda às 4 da manhã para pegar no serviço e carrega no braço saco de cimento para a obra. O golpe “do Bolsonaro”, aí, não assusta ninguém – a maioria, por sinal, ficaria a favor se fosse consultada. O povo acha que golpe só faz mal para “político” – e político, na sua opinião, é “tudo ladrão safado”. Fica chato dizer isso? Fica. Mas é assim. Não esperem, portanto, o povão nas ruas, indignado com a “ruptura da ordem democrática”. Quem estaria disposto a tirar do bolso uma nota de 2 reais para defender o STF? E o Senado Federal? Esquece. 

J. R. Guzzo

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