Em quase dois mil dias, Lula vai de presidiário a presidente da República
Um total de 1.730 dias separam o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de sua ruína política, ao se entregar para a Polícia Federal (PF) e passar a viver na carceragem da instituição em Curitiba, em 7 de abril de 2018, condenado pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, à cerimônia de posse do cargo de presidente da República Federativa do Brasil em sua terceira vitória nas urnas eletrônicas. Com mais de 60 milhões de votos em sua sexta corrida à presidência, o ex-metalúrgico voltará a ocupar a cadeira de chefe do Executivo federal e enfrentará um país rachado pela frente, já que seu adversário no segundo turno, Jair Bolsonaro (PL), teve expressivos 58 milhões de votos e perdeu por menos de 1% sua tentativa de reeleição. Muitos capítulos com diversos personagens explicam a história desses mais de dois anos e dez meses em que Lula foi de presidiário à Presidente. O ex-juiz Sergio Moro e o ex-procurador Deltan Dallagnol, a Operação Lava Jato, o Supremo Tribunal Federal (STF), o antigo adversário Geraldo Alckmin (PSB) e o recém-derrotado Bolsonaro participam das páginas de uma das maiores reviravoltas políticas na história do país. O site da Jovem Pan elenca nesta reportagens os principais da trajetória que tirou Lula de uma cela da Polícia Federal, em Curitiba, e o levou a um inédito terceiro mandato à frente do Brasil.
Prisão do ex-presidente
Primeiro presidente da história a ser detido após uma condenação criminal, a entrega do ex-sindicalista foi o último momento de uma trajetória jurídica que se estendeu durante meses. Acusado pelo Ministério Público Federal (MPF) de ter recebido R$ 3,7 milhões em propina de maneira dissimulada, através de um apartamento triplex no Guarujá, no litoral Sul de São Paulo, após a construtora OAS assinar contratos com a Petrobrás, Lula depôs a Moro no dia 10 de maio de 2017 como réu e negou que o imóvel fosse seu e possíveis ordens para Leo Pinheiro, ex-presidente da OAS, de ter destruído possíveis provas. “Eu não solicitei, não recebi, não paguei nenhum triplex”, afirmou o então investigado, que também rechaçou a intenção de comprar o bem. Durante quase cinco horas de depoimento, o petista admitiu, porém, que realizou uma visita ao imóvel pois a empreiteira tinha a intenção de vender o triplex a sua família. “O que eu sei é que, no dia que eu fui, houve muitos defeitos mostrados no prédio, defeitos de escada, defeitos de cozinha. (…) Ele [Ministério Público] deve ter pelo menos algum documento que prova o direito jurídico de propriedade para poder dizer que é meu o apartamento”, disse Lula. Em suas declarações finais, também afirmou ser vítima da “maior caçada jurídica que um político brasileiro já teve”.
Quase dois meses depois do encontro entre Lula e Moro, em julho de 2017, a sentença foi dada pelo então juiz da 13ª Vara Criminal de Curitiba: condenação por 9 anos e 6 meses e a argumentação de que havia “provas documentais” contra petista, além dele ter “faltado com a verdade” no depoimento. No documento de 218 páginas, o agora presidente da República é acusado de tentativa de intimidação da Justiça se torna impedido de exercer cargo ou função pública. No dia 6 de abril de 2018, Moro determinou a prisão de Lula. O petista buscou abrigo no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo, onde iniciou sua trajetória política, e por lá permaneceu durante dois dias. Cercado por apoiadores que formavam um cinturão impossibilitando a entrada de oficiais, Lula negociou sua rendição por 26 horas e optou por ir de encontro à Polícia Federal às 18h40 do dia 8 de abril de 2018. Antes da entrega, o petista discursou aos milhares de ouvintes no local e declarou que se entregaria para “fazer a transferência de responsabilidade” à Operação Lava Jato. “Quanto mais dias me deixarem lá [na prisão], mais Lulas vão nascer no país”, bradou o político, que passaria os próximos 580 dias em uma cela de cinco por três metros quadrados que continha uma cama de solteiro, uma mesa e um banheiro privativo.
Soltura e recuperação dos direitos políticos
Em novembro de 2019, em uma polêmica sessão do Supremo Tribunal Federal, os ministros alteraram o entendimento da Corte sobre a prisão após condenação em segunda instância que prevalecia desde 2016. Com um placar apertado (6 votos a 5), o STF decidiu que os réus no país poderiam apenas ser presos após o trânsito em julgado no processo, ou seja, quando os recursos se esgotarem. Votaram neste sentido os ministros Marco Aurélio, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Dias Toffoli. Com isso, o caminho para a soltura de Lula estava traçado. No dia 8 do mesmo mês, o juiz Danilo Pereira Júnior, da 12ª Vara Federal de Curitiba, determinou a soltura do ex-presidente. Ao deixar a carceragem da PF, Lula criticou o “lado podre da Justiça, do Ministério Público e da Receita Federal” que trabalharam, em suas palavras, para “criminalizar a esquerda, o PT e ele mesmo”. “As portas do Brasil estarão abertas para que eu possa percorrer esse país”, declarou Lula, que ainda encontrava-se inelegível.
Na esteira das mudanças no Supremo Tribunal Federal e com as revelações de que Moro teria atuado de maneira parcial durante o julgamento do ex-presidente Lula, o ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no STF, determinou, em 8 de março de 2021, a anulação de todas as condenações impostas pela Justiça Federal do Paraná. O entendimento do magistrado foi o de que não havia relações entre os desvios realizados na Petrobras – fato determinado e objeto de investigação da Lava Jato – com as irregularidades e possíveis esquemas atribuídos ao petista. Com isso, os processos que já haviam sido julgados em Curitiba passariam a ser analisados pela Justiça Federal do Distrito Federal. A decisão monocrática, que afetava os casos do tríplex do Guarujá e do sítio de Atibaia, foi referendada pelo plenário do tribunal no mês seguinte por 8 votos contra 3 – Fachin, Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Luís Roberto Barroso. A Segunda turma do STF também votou pela parcialidade de Moro como juiz e o entendimento foi referendado pelo plenário da Corte com a concordância de Gilmar Mendes, Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Rosa Weber. Com as decisões, o principal líder do Partido dos Trabalhadores retomou os seus direitos políticos e poderia se candidatar a cargos eletivos. Dias após as decisões da Suprema Corte, o petista retornou ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC para realizar um discurso e passou a mirar o governo federal e a gestão Jair Bolsonaro.
Redenção política
Nas eleições de 2018, Lula lançou-se como candidato sem ter a certeza de que seria o nome do Partido dos Trabalhadores para a presidência da República. Com as sucessivas condenações e a perda de seus direitos políticos, seu então vice Fernando Haddad (PT) foi alçado ao posto de sucessor do ex-líder sindicalista. Em uma eleição marcada pela disseminação de notícias falsas, Haddad até chegou ao segundo turno, mas foi derrotado pelo então deputado federal Jair Bolsonaro, que impôs ao PT a primeira derrota em uma eleição presidencial no século 21. Lula, então, buscou uma saída inesperada: convidou o ex-governador Geraldo Alckmin, adversário histórico dos petistas, para ser o vice em sua chapa. Um dos fundadores do PSDB e recém-filiado ao PSB, Alckmin simboliza o movimento feito pelo agora presidente da República na direção do centro, na tentativa de criar uma chamada frente ampla contra Bolsonaro.
Ao longo da campanha, Lula recebeu o apoio da deputada federal eleita Marina Silva (Rede), com que o PT havia rompido, da senadora Simone Tebet (MDB), do ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles (União Brasil), de cinco ex-ministros do STF – Carlos Ayres Britto, Carlos Velloso, Celso de Mello, Joaquim Barbosa e Nelson Jobim – e de economistas conhecidas como “pais do Plano Real”, como Armínio Fraga, Pedro Malan e Pérsio Arida. Neste dia 1º de janeiro, Lula é empossado como presidente da República pela terceira vez e encerra um ciclo de 34 meses em que o petista foi de uma prisão ao Palácio do Planalto.
Bolsonaro ignora posse e recebe carinho de apoiadores nos EUA
Afastado do agitado dia político que vive o Brasil neste domingo (1°), o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) aproveitou o primeiro dia do ano em Orlando (EUA) recebendo o carinho de apoiadores que residem em solo norte-americano.
O ex-chefe do Executivo posou para fotos ao lado de admiradores, foi elogiado e concedeu autógrafos. Em momento algum, ele mencionou a posse de seu rival político, Lula, que se desenrola em Brasília.
Bolsonaro tampouco comentou o pronunciamento de fim de ano do ex-vice-presidente, Hamilton Mourão, que teceu críticas veladas a ele em razão do silêncio do até então líder do Planalto diante de o que chamou de “clima de caos”.
O ex-presidente deve permanecer nos Estados Unidos até o fim do mês de janeiro, segundo previu portaria publicada no Diário Oficial da União. Ele separou um tempo sabático para si mesmo, a esposa, Michelle Bolsonaro, e a filha caçula, Laura.
O último pronunciamento de Bolsonaro sobre a situação política que vive o Brasil ocorreu nesta sexta-feira (30), em transmissão ao vivo de 52 minutos. Na ocasião, ele pontuou que “o mundo não vai acabar dia 1° de janeiro”.
– Não vamos achar que o mundo vai acabar dia 1° de janeiro e vamos para o tudo ou nada. Não tem tudo ou nada. Inteligência. Vamos mostrar que somos diferentes do outro lado – assinalou.
Apesar da derrota nas eleições presidenciais, o bolsonarismo sai fortalecido em 2022
Neste sábado, 31, chegou ao fim os quatros anos de mandato do governo de Jair Bolsonaro. Eleito pela primeira vez para um cargo público em 1989, quando venceu disputa na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, o parlamentar chegou à Câmara dos Deputados em 1991, sendo reeleito para outros seis mandatos consecutivos. Em 2018, candidato à Presidência pelo nanico Partido Social Liberal (PSL), ele ganhou relevância no cenário eleitoral e passou a despontar nas pesquisas de intenções de votos após ser vítima de uma facada durante campanha em Juiz de Fora, cidade de Minas Gerais. Eleito com 55% dos votos naquele ano, em um segundo turno disputado contra o ex-ministro da Educação Fernando Haddad (PT), nome escolhido para substituir Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Bolsonaro passou de candidato azarado a presidente da República. Símbolo máximo do bolsonarismo, corrente política da direita que têm o atual presidente como principal expoente, Bolsonaro deixa agora o Palácio do Planalto após derrota nas eleições de outubro, a sua primeira na vida pública.
Ainda que fique o gosto amargo do segundo lugar e a eleição de 2022 represente um revés histórico para o futuro ex-presidente, o resultado das urnas está longe de refletir uma derrota do bolsonarismo. Paulo Niccoli Ramirez, cientista político da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), cita que apesar da vitória de Lula, Jair Bolsonaro deixa uEssa base do bolsonarismo citada pelo cientista político fica ainda mais evidente quando observados os resultados da eleição ao Legislativo Federal neste ano, que também trouxe uma onda conservadora para o Parlamento brasileiro. Isso significa maior apoio dos congressistas para viabilizar pautas conservadoras, tradicionalmente defendidas por Jair Bolsonaro, mas também pode representar uma oposição substancial ao terceiro mandato de Lula. Em números, é possível dizer que o Partido Liberal (PL), legenda de Bolsonaro, desponta como a sigla que mais elegeu parlamentares em 2022. Na Câmara, por exemplo, a bancada do PL terá 99 deputados, contra 68 petistas – no total, os partidos que apoiaram Lula terão 122 deputados na Casa. No Senado, a renovação de um terço da Casa também impulsionou a eleição da direita conservadora, levando o PL ao posto de maior bancada, com 15 senadores contra 9 do PT. Em outras palavras, os dados mostram que apesar de Bolsonaro não ter sido reeleito na disputa mais acirrada da história da política brasileira, o bolsonarismo sai vitorioso em 2022 e ainda respira – e tem forças – para 2026.
ma “herança” na vida pública que pode repercutir a longo prazo e minar o futuro governo petista. “Havendo um fracasso do governo Lula do ponto de vista econômico e social, Bolsonaro tem peso para a próxima eleição”, inicia o cientista político, que exalta a “base sólida” construída pelos bolsonaristas em diferentes níveis de governo. “Com essa base sólida do bolsonarismo, a tendência é que haja uma sabotagem do novo governo e isso beneficia a imagem do Bolsonaro a longo prazo”, aponta Niccoli Ramirez.
Neste sentido, o cientista político Leonardo Barreto defende que o futuro do bolsonarismo vai depender do atual presidente. Segundo ele, apesar de ter construído uma “unidade” na direita, com a junção de seus representantes em mais de um partido, o desafio de Bolsonaro será manter as bandeiras da direita conservadora ligadas ao seu nome. Na visão de Barreto, o atual presidente tem potencial e “recall eleitoral” para se posicionar como um líder da oposição ao governo Lula e das pautas conservadoras, se mantendo como uma “sombra” para 2026. “Bolsonaro tem todas as condições de fazer oposição de natureza popular, que tenha enraizamento no Congresso, que tenha manifestações nas ruas e apelo eleitoral já para daqui a dois anos [nas eleições municipais]. Mas ele tem que querer liderar, e desde o resultado das eleições tem havido um certo questionamento da sua capacidade de liderança nesse processo. Então vamos ter que ver em que direção isso vai”, conclui.
Michelle Bolsonaro anuncia fim do Pátria Voluntária: “Gratidão”
A ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro emitiu uma nota, nesta segunda-feira (2), informando o encerramento do programa de governo Pátria Voluntária, coordenado por ela durante o mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Ela expressou gratidão a todos que contribuíram para a iniciativa.
– A equipe que fez parte do Pátria Voluntária nos últimos três anos despede-se do programa. Esclarecemos que não estaremos mais à frente do trabalho e das redes sociais do Pátria Voluntária por ser um PROGRAMA DE GOVERNO. Agradecemos a cada um que, durante esse tempo, nos ajudou na construção desta iniciativa, que nasceu com o intuito de espalhar o voluntariado por todo o país – escreveu.
Ela prosseguiu afirmando que a equipe foi bem-sucedida em levar a “solidariedade” aos locais mais remotos do país.
– Graças à colaboração de cada um que participou das ações promovidas pelo programa, ajudou a divulgar e disseminar a importância do voluntariado e acompanhou nossas redes sociais, conseguimos levar a solidariedade aos locais mais remotos do Brasil!
Michelle finalizou pedindo para Deus abençoar o Brasil.
– O Pátria Voluntária agradece a todos que, até hoje, fizeram trabalho voluntário ou participaram de alguma forma das ações do programa. Em nome de todos os que foram alcançados pelo poder da solidariedade, deixamos registrada a nossa gratidão! 🤟🏽 Que Deus abençoe a Nossa Nação 🇧🇷 – concluiu.